sábado, 25 de abril de 2009

Presságio


Não sei fazer críticas como meu colega deste blog. Assim sendo, apenas farei alguns comentários com relação ao desenrolar do filme (ou seja, há spoilers).

John Koestler (Nicolas Cage) é viúvo. Físico (acho...) e professor no MIT, tenta criar sozinho seu filho Caleb (Chandler Canterbury - agora chega; não vou mais ficar procurando o nome dos atores). Seu pai é pastor e, por conta de algumas "diferenças" com respeito às suas "visões de mundo", os dois não se falam há tempos.

O molequinho estuda numa escola fundada há 50 anos. Em sua inauguração (há 50 anos atrás...), os alunos fizeram desenhos imaginando como seria o futuro e os colocaram numa cápsula do tempo. Todos fizeram isso, exceto Lucinda, a menininha-assustadora-de-cabelos-negros-padrão, que escreveu uma série ininterrupta de números, movida por barulhos esquisitos que ouvia em sua cabeça.

E, 50 anos depois, é justamente essa folha cheia de números que o Caleb recebe, ao abrirem a cápsula do tempo na comemoração do aniversário da escola.

Como o Cage se recusa a sair para pegar mulher e não tem mais o que fazer, resolve estudar essa folha. Como eu disse, nela há somente números (não há nem vírgulas nem nada separando-os). Ele nota a data do atentado de 11 de setembro de 2001, lá (no caso, ele vê 09112001, número esse "largado" no meio a folha), e, sem ter o que fazer (como eu já havia dito), dá uma olhada no Google (verdadeiro oráculo de Delfos da modernidade), e vê que a seqüência de dígitos que segue os já aleatórios dígitos por ele escolhidos fornece a quantidade de mortos no atentado.

Aí o John fica malucão e, num arroubo infinitamente superior a todos os outros arroubos de coçação de saco já registrados em Hollywood (que eu me lembre agora, pelo menos), resolve checar simplesmente TODOS os números da lista (sendo que não há um padrão, pois o números de dígitos descrevendo quantidade de mortos pode variar, o que o obriga a ir andando de dígito em dígito, percorrendo toda a lista várias e várias vezes...)! Nesse processo, ele encontra perdidos no meio dela, em ordem cronológica, várias tragédias que ocorreram ao longo dos últimos 50 anos. Mesmo assim, entre uma seqüência de números descritiva de tragédia e outra, há seqüências de números para os quais ele (ainda) não encontrou explicação.

O filme, num primeiro momento, tenta opor a "visão de mundo" que descreve a existência como uma sucessão de eventos probabilísticos (olá, física quântica!) à uma "visão de mundo" determinística (mas fica claro que não se trata de um "determinismo de Física Clássica", digamos assim, mas de um "determinismo derivado de um plano maior"). O John, num primeiro momento, se mostra, como um "bom cientista", partidário da primeira corrente (mas deixa claro que o é não por ser um "bom cientista", mas sim porque "mimimi, minha esposa morreu num acidente, então Deus não existe por conta disso e o Universo gira em torno do meu umbigo por eu ter tal posicionamento só por conta de uma tragédia pessoal e não por conta de evidências científicas, mimimi"...). Só que, com a aparição dessa folha com os números, ele fica "maluco" (principalmente porque nela estava sendo mostrada também a tragédia que havia vitimado a esposa dele, no passado), achando que poderia ter impedido a morte da esposa caso estivesse de posse da folha na época.

Claro que esse pensamento é uma estupidez, afinal, se o futuro foi previsto (logo, o universo é determinístico), a sua tentativa de impedir que ele aconteça também foi "computada no cálculo geral das coisas" (imaginem só a quantidade verdadeiramente infinita de variáveis que entra na conta para se "prever o futuro"), logo, ela não vai dar em nada. Porém, mais uma vez, como tudo já está escrito, você vai lá perder seu tempo e tentar assim mesmo.

Ainda tinham mais 3 catástrofes listadas na folha para ocorrer. Ao presenciar a primeira, o Cage percebe que os números não decifrados eram coordenadas de GPS (esperta a menina de 50 anos atrás, não?). Ele, então, vai procurar a autora dessa folha, mas encontra a filha dela, Diana, e a neta, Abby, e descobre que a mulher morreu. A neta da garota também ouve as tais vozes (que são "faladas" por homens de preto...), e o Caleb também passa a escutá-las (tanto que ele tira o aparelho de ouvido quando não está com saco de ouvi-las, mas depois de um tempo isso deixa de adiantar e ele continua as ouvindo mesmo assim).

Faltam 2 tragédias. O Cage vai até Nova York tentar impedir uma, e é claro que dá errado (como eu já havia exposto numa linha de raciocínio anterior), e morre um monte de gente mesmo assim. Ele comenta isso com um colega cientista do MIT, e este diz que sua "mente científica" o avisa para "esquecer essa história"... Só comentei essa parte porque, por favor, isso é um absurdo! Que "mente científica" é essa, que avisa alguém para enfiar a cabeça na terra como uma avestruz, de modo a ignorar uma evidência absurda de que a existência seria determinística? Simplesmente ridículo! Vale ressaltar que seria uma evidência de "determinismo de Física Clássica", e não "determinismo de plano superior"... Mas eu não sei se o roteirista e o diretor entendem a diferença. Mas isso não importa...

Mas voltando. Juntamente com a filha da Lucinda, o Cage descobre que a raça humana será obliterada na última tragédia. O que ocorrerá será a emissão de uma labareda do Sol, que fritará o planeta (ou seja, está na cara que não dá para impedir MESMO)!

Como está tudo indo para o espaço, o Cage resolve ligar para o pai pastor, e dizer para ele e o resto da família se mandarem com mantimentos para alguma caverna, e ficar por lá (isso seria inútil frente a uma labareda que irá privar o planeta de água e, inclusive, de atmosfera, mas o pastor, é claro, não sabe disso), no que o pastor, do alto de sua ignorância religiosa, responde que "não vai fazer nada; vai é ficar em casa e deixar que seja feita a vontade do deus dele"...

Isso me lembrou de uma piada: estava tendo uma enchente na cidade de um religioso. Passou um cara de jipe, e se ofereceu para tirar o mané da casa dele. O religioso disse que não iria a lugar nenhum, pois deus o salvaria. O tempo passa, a água sobe, e aparece um cara de barco, também se oferecendo para salvar o religioso, que dá a mesma resposta. Com a água já no teto da casa, aparece um cara de helicóptero, e mais uma vez o religioso disse a mesma coisa. Pois bem, ele morreu. Chegou no céu e foi tirar satisfações com deus, reclamando que sempre havia sido muito fiel, penitente e não sei mais o que, mas que no final das contas deus não o tinha salvado da enchente. Deus, então, respondeu: "eu te mandei um jipe, um barco, e até um helicóptero, mas você não quis sair de lá! Tu é burro pra c@r@lho; p#t@ que o pariu!" (tá, a resposta não foi bem essa, mas está aí a idéia)...

Mas que seja, isso foi só para comentar um pouco sobre estupidez religiosa (bastante pertinente, afinal, o personagem era um pastor).

Os homens de preto (só a Abby e o Caleb os escutam, mas todo mundo pode vê-los), numa situação que não vale a pena contar, seqüestram as crianças (a Abby e o Caleb...), e os levam para a última coordenada de GPS escrita pela Lucinda. O John chega lá logo depois (a Diana tinha morrido num acidente de carro, perseguindo os homens de preto após estes terem seqüestrado as criancinhas).

Lá chegando, ocorre a "revelação": os homens de preto são E.T.s! Eles são de uma raça de desocupados espaciais que fica viajando pelo cosmos, chegando em planetas com vida inteligente, e sussurrando telepaticamente o futuro para os seus habitantes (os alienígenas tem tecnologia para singrar o cosmos, e também conhecem a estrutura determinística da existência, e, é claro, agem de acordo com ela, até porque não fazê-lo seria impossível). Os habitantes capazes de ouvir o sussurro telepático (que era inclusive captado pelo aparelho de audição do Caleb, e não me perguntem como um equipamento que lida com ondas sonoras pode captar "vozes" "faladas" diretamente no seu cérebro) são os "selecionados" pelos E.T.s para serem salvos das mega catástrofes planetárias e levados para outro planeta para continuar suas vidinhas de playmobil (afinal, não há livre arbítrio). O "curioso" é que só são selecionados 2, um macho e uma fêmea (no caso, o Caleb e a Abby) e, já que estão nessa, mesmo, os aliens brincam de arca de Noé (história clonada da do Utnapishtim, presente na Epopéia de Gilgamesh) e pegam também um casal de animais de cada espécie, e os levam para fora da Terra antes que esta seja bem passada pelo Sol.

O Cage, sabendo que vai morrer, mesmo, vai para a casa do pai ser frito em família. Vale ressaltar que a casa do pai dele demonstrava um "alto poder aquisitivo" por parte do coroa, o que demonstra que ser pastor é uma boa opção de carreira em qualquer parte. Mas pelo menos o velho se mostrou um religioso de verdade, o que, pelo menos a meu ver, é um atenuante (ele enganou a si mesmo antes de enganar os outros).

Os aliens, então, largam as duas criancinhas e os demais animais da Terra num outro planeta alienígena, e se mandam, o que demonstra como são escrotos: primeiramente, só com um representante de cada sexo de uma espécie não há variabilidade genética suficiente para que a espécie sobreviva! Ou seja, os E.T.S se deram ao trabalho de cruzar o universo só para fazer com que as espécies de animais da Terra sejam extintas em outro planeta, em vez de na própria Terra. Em todo caso, como o universo é determinístico, não é culpa dos E.T.s, eles simplesmente tem que se dar a esse trabalho "porque sim", o que, pensando bem, deve deixá-los muito fulos da vida.

Mas há outra "interpretação": esse filme ignora completamente a existência da física quântica (afinal, no universo apresentado na película, a existência é determinística), então qual é o problema de ignorar também a biologia, e assumir que só com um macho e uma fêmea de cada espécie, se pode dar continuidade à mesma? Inclusive, nota-se que os aliens tem "asas" de "energia" (eles meio que são "feitos" de "energia", na falta de um termo descritivo melhor), então a partir daí pode-se inferir que a idéia de "anjos" e o conceito de "religião" teriam surgido devido ao contato dos primeiros humanos do planeta com esses aliens, sendo que, no caso, esses primeiros humanos teriam sido trazidos aqui pelos próprios aliens, juntamente com nossa fauna (ou seja, nada de evolução; viva o criacionismo alienígena!)...

Mas, mesmo com essa interpretação, os E.T.S continuam sendo escrotos, pois levaram os animais para outro planeta, mas não levaram as plantas! Os herbívoros vão, por acaso, comer a vegetação alienígena do planeta onde foram parar? Aposto que aquelas folhas reluzentes da árvore prateada mostrada no final provocam diarréia! Então, os herbívoros morrem sem comida, e os carnívoros morrem sem os herbívoros... E, para complementar a escrotidão dos alienígenas, eles largaram as criancinhas sozinhas nesse mundo! Como elas vão conseguir comida e abrigo? Vão morrer em dois tempos! Mas, de novo: não é culpa dos E.T.s, o universo é que é determinísticos e os força a cometerem esses atos cruéis e inúteis...

Outra curiosidade: em determinado momento, os aliens mencionam que os mortos "vão para um lugar melhor". Mas não dá para saber se só estão querendo ser "bonzinhos", ou "escrotos", dependendo da interpretação, enrolando todo mundo ("Não, imagina, que isso, não estamos deixando vocês todos aí para fritar a troco de nada; depois dessa vocês vão para o paraíso..."), ou se no "universo" definido pelo filme, realmente, o "além-vida" existe. Em todo caso, é essa a interpretação que o Cage assume ("vou morrer e vou para o céu, porque fui um bom menino esse ano"), antes de ir para a casa do pai morrer com a família. E ele também assume a interpretação "determinismo de um plano maior", em vez do "determinismo de Física Clássica", apesar de não haver em momento algum do filme qualquer evidência que indique que o "determinismo" desse universo é o primeiro em vez do segundo. Não sei se isso aconteceu porque o roteirista e o diretor do filme não sabem a diferença entre ambos, ou se simplesmente porque isso combina com a postura do personagem, mesmo.

Enfim, achei esse filme meio esquisito, pois ao mesmo tempo em que ele ignora a ciência (física e biologia), ele lida com extraterrestres... É meio que um filme de temática religiosa "misturado" com ficção científica por conta dos E.T.s. É meio bizarro, o que faz com que eu não consiga dizer se gostei ou não. E, só para deixar claro, não é implicância com a "visão religiosa" do filme. Esse foi o "universo" estabelecido para a história e fim, nada contra. Gosto de diversas histórias que se passam em universos também absurdos. Só achei a mistura estranha, mesmo...

Reza a lenda que um dos objetivos desse filme seria levar o espectador a discutir se o futuro pode ser mesmo previsto ou não, ou algo do tipo. Se isso for verdade, pelo menos na minha opinião, ao estabelecer que, na história, o que está valendo é o determinismo, o filme falhou miseravelmente. Se era mesmo para estimular discussão, acho que o filme deveria deixar essa questão ambígua... Mas não importa, isso é exigir demais de um "filme pipoca".

Ah, sim: faltou comentar com relação ao desempenho dos atores! Não o fiz porque, hããããã, não sei fazer. Só o que consigo dizer é que nenhum deles me deixou irritado. Acho que isso deve valer de algo.

Para terminar esse texto gigantesco, mais 2 detalhes:

1 - As informações sobre o Sol dadas pelos alunos do MIT do Cage estão erradas (mas que burros; dá zero para eles!);

2 - O Cage diz que, quando a mulher dele morreu, ele não sentiu nada, mas que antes disso sempre tinha acreditado que se sente algo quando nossos entes queridos se vão... Como assim? Que cientista era esse? Mas enfim, esse detalhe só serve para reforçar a minha descrição do "mimimi" do personagem do Cage com relação à postura dele de "acreditar" num universo probabilístico num primeiro momento da história do filme baseado única e exclusivamente em suas mágoas pessoais, e não em evidências científicas...

2 comentários:

Jiroumaru disse...

Não vi o filme, mas concordo com suas colocações. Esses roteirists hollywoodianos são patéticos quando tentam fazer algo científico...

ghfdc disse...

Pois é, mas dessa vez a questão nem era essa... Eu só achei a mistura meio "bizarra", mesmo...

O troço tem uma temática religiosa (como "A Profecia", forçando a barra), sendo determinista e talvez criacionista (adotando-se a interpretação que dei), mas aí colocam alienígenas, e um protagonista que é físico do MIT e que não questiona nada disso! Quer dizer, ele questiona, mas só por conta de convicções geradas por uma tragédia pessoal, e não por conta do que ele aprendeu na escola/faculdade (e, no caso, sendo professor, deveria além de tudo ensinar)...

Isso de misturar ciência, filosofia e religião só ficou legal em Babylon 5!

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